quinta-feira, 12 de setembro de 2013

A CENTÉSIMA OVELHA

Senhor, a centésima ovelha não é a alma que cai exausta, não é como a cabra caprichosa, que partiu ao sopro da independência, que inebria a centésima : ela era a mais triste do aprisco, a menos bela, aquela que se desespera.

Ela começou arrastando-se atrás do rebanho, já indiferente ao barulho das fraternas patinhas e afastando-se da poeira. 
O cachorro de seu dono por vezes a tinha mordido, sem compreendê-la, e o próprio dono a tinha ferido com seu cajado, e este golpe, mesmo suave, lhe tinha doído muito.

Um dia, ela preparou sua fuga, no desvio de um caminho da roça rodeado de cercas.  Viu-se então livre para ir sozinha ao encontro da morte.

Durante um momento, ela teve saudade do aprisco bem protegido, à noite, em um cercado, no calor mútuo das lãs sujas. 

Afastou-se. 

Ouviu seu nome nos lábios do pastor  cuja voz, para ela, tinha se tornado mais severa há algum tempo.

Abafou o eco.

Agora ela estava, de fato, sozinha, sem sofrimento, sem inveja, simplesmente abandonada.

A noite caiu.

Ela adormeceu de desgosto e de tristeza, com o sono inevitável e agitado do jardim da agonia, no fundo de um arbusto, na pedra.

Um barulho de galhos afastados despertou-a, ela sentiu-se erguida.

E reconheceu, sem abrir os olhos, o bom calor costumeiro das mãos do seu dono, vindo só para ela, reconheceu o calor de seu pescoço.

A centésima ovelha, Senhor, é a alma que não tem esperança.


(Padre Joseph Doucet)

Ao contrário de algumas interpretações absurdas, o bom pastor, não quebra a perna de sua ovelha para traze-la de volta pra casa, mas a pega com carinho, e a coloca nas costas com amor.